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Confiança de consumidor e empresa tem queda mais forte e recuperação mais lenta no Brasil


Incertezas e destruição de empregos e empresas tornam retomada mais difícil


Apesar de a confiança de consumidores e empresários ter apresentado dois
meses seguidos de recuperação após o fundo do poço verificado em abril, o
indicador brasileiro encontra-se em uma situação desfavorável em relação à
maioria dos países economicamente relevantes.
Segundo levantamento do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da FGV), o
Brasil partiu de um patamar mais baixo de confiança antes da crise e, quanto
se considera as magnitudes da queda e da recuperação, o país está em pior
situação entre cerca de 20 economias selecionadas.
A confiança da indústria brasileira, por exemplo, caiu quase 50% de março
para abril (cerca de 45 pontos, praticamente o dobro da média do recuo nos
países selecionados).
Algo similar foi visto apenas na China. O país asiático, no entanto, recuperou
em março mais de 100% da perda de fevereiro (pior mês nesse caso). O Brasil
não chegou no meio do caminho e apresenta recuperação mais lenta que
praticamente todos os países selecionados.
Em relação à confiança dos consumidores, a queda foi de 50 pontos, quase o
dobro do verificado no Japão e na Colômbia, que ficaram em segundo lugar
entre os países mais afetados nesse indicador. Nesse caso, a Brasil tem uma
taxa de recuperação mais alinhada a outros países, mas que é favorecida pela
base de comparação mais baixa.
"Se a gente considerar o momento anterior da pandemia e que o Brasil é o
país que tem o indicador de incerteza mais elevado do mundo, isso tudo
contribui para que a gente imagine que a recuperação da confiança não vai
ser tão rápida assim. O Brasil vai ter mais dificuldade que outros países",
afirma o economista Rodolpho Tobler, da FGV Ibre.
Segundo Tobler, é muito provável que abril tenha sido mesmo o fundo do poço
para a economia, mas ainda não se sabe se haverá uma nova onda de
contaminação que possa reverter o processo de reabertura das últimas
semanas.
Além disso, as sondagens da FGV consideram tanto a avaliação da situação
atual como a expectativa em relação ao futuro. E o resultado tem sido mais
influenciado pelo indicador de expectativas, pois na situação atual é natural
que as pessoas imaginem um futuro melhor do que o presente.
O economista afirma ainda que o consumidor brasileiro está menos confiante
que o empresariado, algo que se explica pelos altos índices de desemprego e
afeta o principal pilar da economia, o consumo das famílias, que deve
demorar a se recuperar.
Segundo Tobler, o pagamento do auxílio emergencial a trabalhadores
informais contribuiu para melhorar a confiança do consumidor, mas não foi
suficiente para recuperar o que foi perdido.
Marcelo Neves, professor da Fipecafi (Fundação Instituto de Pesquisas
Contábeis, Atuariais e Financeiras da FEA/USP), afirma que os índices de
confiança e outros indicadores econômicos confirmam que a economia está
em processo de recuperação, mas a destruição de empresas e empregos nos
últimos meses vai atrasar esse processo.
"Aparentemente, a gente bateu no fundo do poço e estamos em uma
trajetória de estabilidade para melhora. A notícia ruim é que o poço é muito
fundo. Agora, é preciso dar tração à economia", afirma Neves.
"Será muito difícil ter uma retomada muito rápida. Estávamos atrasados em
relação ao resto do mundo antes da crise. E você teve destruição de emprego,
destruição de renda, empresas fecharam, pararam de recolher impostos. Vai
ter menos gente para empurrar o carro."
Ele afirma que o auxílio emergencial e outras ações do governo foram
importantes para essa estabilização, mas que agora é necessário retirar
lentamente esses incentivos e, ao mesmo tempo, buscar outras formas de
ação estatal para que haja uma retomada do crescimento.
Além disso, afirma ser importante que a sociedade possa caminhar na mesma
direção, a despeito dos problemas políticos, e que haja mais harmonia entre
os Poderes para que sejam aprovadas reformas que estimulem os
investimentos privados, como ocorreu no caso recente da aprovação do novo
marco do saneamento pelo Congresso.
O professor de macroeconomia do Insper Eduardo Correia afirma ver nos
indicadores de confiança, incluindo sondagens e índices financeiros como
Bolsa e juros, um otimismo exagerado.
Ele questiona a capacidade do Ministério da Economia de coordenar um
processo de recuperação econômica que dependa mais da ação governamental
e critica o relaxamento das medidas de isolamento por governos estaduais,
que classifica como precipitada.
"Eu sou muito cauteloso com o caso brasileiro, porque aqui, mais do que em
outros países relevantes economicamente, a gente tem se movido no escuro,
sem testagem para a Covid-19, com manipulação de dados pelo Ministério da
Saúde", afirma Correia.
"O Brasil corre um risco maior do que outros países de ter uma segunda onda
muito forte justamente por causa de um relaxamento prematuro. O que
diferencia o Brasil é essa falta de planejamento."


Fonte: Folha


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